You are not connected to the internet and now in offline mode. Only pages or articles you visited while connected will be available.

  1. Virtual Library
  2. ATOTW Tutorial
  3. Miastenia Gravis e Gestação

Get notified when a new tutorial is published!

Obstetric Anaesthesia

Tutorial 443

Miastenia Gravis e Gestação

Dr Sindy Lee1†, Dr Carly Webb2, Dra Sarah Armstrong3 

1 Residente em Anestesiologia, St George’s Hospital, Londres, Reino Unido  

2 Residente em Anestesiologia, Bristol Royal Infirmary, Bristol, Reino Unido  

3 Consultor em Anestesiologia, Frimley Park Hospital, Frimley, Reino Unido 

 

Editado por: Dr. Gillian Abir, Professor Associado, Departamento de Anestesiologia, Medicina Perioperatória e Clínica da Dor, Stanford University School of Medicine, EUA; Dr. James Brown, Professor Assistente, Departamento de Anestesiologia, Medicina Perioperatória e Clínica da Dor, BC Women’s Hospital, Canadá 

 

E-mail do autor correspondente: sindy.lee@doctors.org.uk 

 

Publicado em 16 de março de 2021 

Published March 16, 2021

PONTOS CHAVE

● Comprometimento respiratório, envolvimento bulbar e disfunção autonômica são comuns na miastenia gravis.
● São necessários ao longo da gestação avaliação neurológica cuidadosa e revisões sistemáticas dos medicamentos.
● Anestesia neuraxial pode ser feita com segurança em pacientes com miastenia gravis.
● Para pacientes com miastenia gravis com envolvimento bulbar ou comprometimento respiratório significativo, é
importante considerar em nível individual os riscos e benefícios tanto da anestesia neuraxial quanto geral.

NTRODUÇÃO 

Miastenia gravis (MG) é uma doença autoimune com pico de início entre mulheres em idade reprodutiva (i.e, 20 a 30 anos). As mudanças fisiológicas normais da gestação podem levar à deterioração de alguma situação neurológica preexistente, por ex., exacerbando comprometimento respiratório existente. Avaliação completa e planejamento multidisciplinar cuidadoso são necessários para assistência periparto segura. 

Este tutorial discutirá a fisiopatologia da MG e implicações para a gestante, incluindo estratégias de manejo para o trabalho de parto e parto. 

MIASTENIA GRAVIS 

Incidência e Prevalência 

MG é um transtorno autoimune caracterizado por fraqueza e fadiga da musculatura esquelética (estriada), sendo a incidência de aproximadamente 50 a 140 por milhão, com prevalência de 1 em 10 000 a 50 000.1,2 

Fisiopatologia e Diagnóstico 

MG se caracteriza por destruição dos receptores nicotínicos da acetilcolina na junção pós-sináptica levando à redução da transmissão dos impulsos nervosos na placa motora terminal (Figura 1). MG se caracteriza por fraqueza da musculatura voluntária por fadiga devido à redução da liberação da acetilcolina pelo estímulo repetido.3 Dificuldades mastigatórias e disfagia indicam fraqueza da musculatura faríngea e laríngea, descritas como envolvimento bulbar. 

Um exame online está disponível para educação médica continuada auto-direcionada (self-directed continuous medical education _ CME). O tempo estimado de realização do exame é 01 (uma) hora. Favor registrar o tempo gasto e relatar ao seu órgão credenciador se desejar obter pontos de CME. Será emitido um certificado ao passar no exame.  Ver política de credenciamento aqui here.     

 

Figura 1. Nervo normal (esquerda) e nervo afetado por Miastenia Gravis mostrando anticorpos contra o receptor de acetilcolina resultando na redução da transmissão neural (direita). 

 

MG é diagnosticada usando um teste com anticolinesterase, onde a força melhora com a administração de edrofônio (teste de Tensilon®). A eletromiografia demonstra uma resposta decrescente à estimulação repetida dos nervos motores periféricos. São encontrados anticorpos contra receptores da acetilcolina em 85% dos pacientes com MG generalizada e em 50% a 60%  dos pacientes com MG ocular. 4 

MG é frequentemente associada a outras doenças autoimunes, principalmente doença da tireoide, artrite reumatoide e lúpus eritematoso sistêmico, portanto, estas devem ser ativamente investigadas.5 

Tratamento 

A base do tratamento para MG envolve anticolinesterásicos como piridostigmina (aumenta a acetilcolina disponível na junção neuromuscular) e terapia imunossupressiva (reduz anticorpos) com corticosteroides, azatioprina, ciclosporina ou micofenolato. 

A dose de anticolinesterásicos pode precisar ser incrementada durante a gestação devido a um maior volume de plasma e mais eliminação renal. A hiperemese gestacional pode afetar a absorção dos medicamentos e pode ser necessária rota parenteral para melhorar a confiabilidade da absorção. 

É seguro continuar esteroides sistêmicos durante a gravidez, ao contrário de azatioprina e micofenolato que não são recomendados devido ao risco potencial de teratogenicidade. É aconselhado envolver um neurologista (com interesse especial em MG) no planejamento da gravidez, a fim de avaliar os riscos e benefícios da continuação de cada medicamento. 

Se os sintomas se intensificarem, é importante distinguir entre uma crise miastênica por subtratamento e crise colinérgica por excesso de tratamento com inibidores de acetilcolinesterase, uma vez que o manejo é diferente (Tabela 1). Trabalho de parto, privação do sono, infecção, cirurgia, estresse emocional e dor são todos precipitantes de uma crise miastênica.6 Imunoglobulina intravenosa ou plasmaferese podem ser consideradas em uma crise miastênica. 

Há associação de MG com timoma (15% de pacientes) e a timectomia pode melhorar os desfechos clínicos em pacientes de MG, reduzindo a gravidade dos sintomas e frequência e necessidade de hospitalização.8 

Em pacientes com MG, é importante evitar medicamentos que possam exacerbar a fraqueza na junção neuromuscular (Tabela 2). Considerações particulares sobre medicamentos anestésicos são discutidas abaixo em ‘Anestesia para Parto Cesáreo’. 

Curso da Doença 

Durante a gestação, é difícil prever o curso clínico da MG; melhora em um terço, permanece igual em um terço e piora em um terço das pacientes.10 Pode ocorrer remissão ou deterioração em qualquer trimestre ou durante o período pós-parto. 

MG e Mudanças Fisiológicas na Gestação  

Mudanças anatômicas na gestação diminuem o tônus do esfíncter esofágico inferior, o que pode levar a aumento do risco de refluxo esofágico. Pacientes com MG e envolvimento bulbar associado estão em maior risco de aspiração pulmonar, uma vez que são menos capazes de limpar secreções e proteger a via aérea. 

Fraqueza na musculatura intercostal em pacientes com MG pode exacerbar a redução da capacidade residual funcional e volume residual, que são alterações anatômicas normais na gestação, o que pode precipitar insuficiência respiratória; no entanto, isto é raro. 

 Desfecho da Gestação 

O útero é composto por músculo liso (ou seja, não estriado) e não é afetado por MG, portanto, o primeiro estágio do trabalho de parto geralmente não é afetado por MG. A musculatura estriada (músculo esquelético) contribui para a força no segundo estágio do trabalho de parto e portanto, pode ser necessário parto assistido para evitar fadiga. 

Dos recém-nascidos de mulheres com MG, 10% a 20% desenvolverão MG neonatal por transferência placentária de anticorpos maternos. Os recém-nascidos afetados apresentam dificuldade na amamentação, fraqueza generalizada e problemas respiratórios. Podem ser necessários tratamento com anticolinesteásicos e um período de ventilação invasiva. MG neonatal tende a ter duração curta na maioria dos casos e a melhora pode ser esperada dentro de 8 semanas. 

O aleitamento materno deve ser evitado em MG neonatal, pois os anticorpos aos receptores da acetilcolina podem ser transferidos para o recém-nascido via leite materno. A medicação anticolinesterásica não cruza para o leite materno, portanto é segura em lactantes. Recomenda-se que as mães que tomam azatioprina ou micofenolato evitem a amamentação.10 

CONSIDERAÇÕES ANESTÉSICAS 

Há 3 áreas principais a considerar para o manejo anestésico em pacientes com MG: comprometimento respiratório, envolvimento bulbar e disfunção autonômica (Tabela 3). 

RECOMENDAÇÕES PARA MANEJO 

Avaliação da Paciente 

As pacientes devem ser encaminhadas para uma clínica de obstetrícia e anestesia de alto risco com avaliação física que inclua o seguinte: 

  • Anamnese detalhada e exame documentado de déficits neurológicos pré-existentes 
  • Curso clínico—estável ou exacerbações frequentes/graves 
  • Comprometimento respiratório e histórico de suporte ventilatório 
  • Envolvimento bulbar 
  • Disfunção autonômica 
  • Capacidade de deitar em decúbito ventral 

Testes Séricos 

  • Hemograma completo 
  • Eletrólitos 

  • Função renal  
  • Função tireoidiana e screening autoimune (se já não estiver completo no diagnóstico) 

Exames 

  • Eletrocardiograma 
  • Testes de função pulmonar 

Após avaliação cuidadosa, um plano de manejo deve ser formulado por equipe multidisciplinar (incluindo anestesiologista, obstetra, neurologista e intensivista) e aprovado pela paciente. 

Trabalho de Parto 

  • Apenas MG não é indicação de cesariana. 
  • Otimize o controle da dor e evite trabalho de parto prolongado para reduzir a fraqueza consequente à fadiga. 
  • Evite esforço e estresse, os quais podem desencadear uma crise miastênica. 

 

  • Evite opioides sistêmicos (intramuscular e intravenosos) e analgesia controlada pelo paciente se houver insuficiência respiratória pré-existente significativa. 
  • Recomenda-se analgesia peridural para o trabalho de parto. 
  • Em pacientes com comprometimento respiratório, considere ajuste cuidadoso de analgesia peridural (tendo como alvo nível sensório de T10); manter o uso de uma solução fraca de anestésico local combinado com opioide (por ex., 0,0625% levo/bupivacaína + 2 µg/mL fentanil, ou 0,4µg/mL sufentanil). Recomenda-se observação direta (um a um) com monitorização contínua. 
  • Considere parto assistido para reduzir a fadiga durante o segundo estágio. 
  • Tratamento com anticolinesterásicos e corticoide deve continuar por toda gestação, talvez sejam necessárias doses parenterais. 

Anestesia para Parto Cesáreo 

Pré-medicação 

  • Antagonista H2 (atenção: ver Tabela 2) para profilaxia antiácida e metoclopramida para estimular o esvaziamento gástrico. 
  • Evite benzodiazepínicos e opioides sistêmicos em função do risco de depressão respiratória. 

Otimize o Balanço Hídrico 

  • Hipovolemia é mal tolerada em pacientes com disfunção autonômica e compressão aorto-cava em posição supina piora a instabilidade cardiovascular. Assegure deslocamento uterino lateral esquerdo e evite hipovolemia. 

Monitorização Invasiva 

  • Considere monitorização invasiva da pressão arterial na presença de disfunção autonômica. 

Tanto a anestesia neuraxial quanto a geral têm sido administradas com segurança em pacientes com MG. A anestesia neuraxial permite o retorno precoce aos medicamentos via oral. Pacientes com comprometimento bulbar e/ou respiratório podem não tolerar um nível médio-torácico de anestesia neuraxial devido à paralisia dos músculos acessórios, mas também podem ter um risco aumentado de aspiração associado à anestesia geral. 

Procure alcançar um bloqueio adequado para a cirurgia (T4 a estímulo com frio) evitando a instabilidade cardiovascular excessiva por bloqueio simpático ou comprometimento respiratório por paralisar muito alto os músculos intercostais. Adicionar uma pequena dose de opioide ao anestésico local reduz a dose total de anestésico local necessária devido a um efeito sinérgico, melhora a qualidade do bloqueio e reduz a necessidade de opioides sistêmicos no pós-operatório. 

A anestesia peridural permite ajuste cuidadoso do anestésico local usando doses incrementais em bolo, o que leva a melhor estabilidade cardiovascular (em comparação com raque) e evita bloqueio excessivamente alto. Pacientes com disfunção autonômica e/ou envolvimento muscular respiratório leve também podem se beneficiar de técnica peridural. O cateter peridural também pode ser usado para administrar anestesia local para controle da dor no pós-operatório. 

A anestesia raquidiana é mais rápida e confiável que a anestesia peridural. Minimiza a dose total de anestésico local administrado (comparado com a anestesia peridural), o que pode ser benéfico, uma vez que altos níveis séricos de anestésico local podem teoricamente potencializar o bloqueio neuromuscular.11 No entanto, raque está associada a mais instabilidade cardiovascular e bloqueio potencialmente mais alto como resultado da velocidade de início e incapacidade de ajustar o efeito. 

A anestesia peridural combinada com um componente raquidiano de baixa dose tem as vantagens tanto da raque quanto da peridural; anestesia cirúrgica confiável pode ser rapidamente alcançada enquanto mantém relativa estabilidade cardiovascular e respiratória. 

Pode ser necessária anestesia geral para proteger a via aérea e fornecer suporte ventilatório se houver insuficiência respiratória significativa. É também uma opção em pacientes com contraindicação para anestesia neuraxial. Há aumento da sensibilidade aos bloqueadores neuromusculares na maioria dos pacientes com MG, o que reduz consideravelmente a dose real necessária, e é importante monitorar de perto a profundidade do bloqueio neuromuscular (o suxametônio é contraindicado: ver Tabela 2). 

Os agentes inalatórios têm propriedades relaxantes musculares e, portanto, a dose deve ser mantida no mínimo. Monitorização da profundidade da anestesia pode ser útil, considerando-se o risco maior de despertar nas pacientes obstétricas. Opioides intravenosos de ação curta podem ser administrados em pacientes com MG.4 

O uso de agentes de reversão é controverso e as opções incluem o seguinte: 

  • Permita recuperação espontânea do atracurio. 
  • Administre sugamadex para reverter rocuronio. 
  • Administre neostigmina para reverter atracurio ou rocuronio. 

Em MG, uma alta dose de neostigmina corre o risco de precipitar uma crise colinérgica onde a fraqueza muscular generalizada pode ser difícil de distinguir de uma crise miastênica (Tabela 1). 

A administração de ocitocina intravenosa pode piorar a hipotensão pré-existente pela disfunção autonômica relacionada à MG e os efeitos vasodilatadores da anestesia; portanto, deve ser administrada com muita cautela em doses divididas ou como infusão. 

Cuidados Pós-operatórios 

O ideal é que as pacientes permaneçam na UTI ou unidade de alta dependência (ou seja, cama monitorada). A avaliação da função respiratória por meio de espirometria pode permitir a detecção precoce da deterioração clínica. Deve ser dado suporte respiratório com fisioterapia respiratória, posicionamento adequado, assistência com eliminação de secreção e ventilação não invasiva ou invasiva, se necessário. 

O monitoramento cardiovascular e a otimização do equilíbrio hídrico precisam continuar no pós-operatório. Medicamentos orais, particularmente anticolinesterásicos, devem ser reiniciados o mais rápido possível.

RESUMO

● Alterações fisiológicas normais na gestação podem exacerbar MG.
● Comprometimento respiratório, envolvimento bulbar e disfunção autonômica são comuns: quando presentes, são
necessárias avaliação cuidadosa da gravidade e documentação detalhada.
● Anestesia neuraxial pode ser administrada com segurança em pacientes com MG.
● Os riscos e benefícios de anestesia geral e neuraxial devem ser considerados para pacientes com MG,
principalmente quando há comprometimento respiratório.
● O anestesista deve pesar individualmente os riscos e benefícios em paciente com MG, de tal forma que a paciente
possa fazer uma escolha informada durante o trabalho de parto e o parto

REFERÊNCIAS 

  1. Phillips L. The epidemiology of miastenia gravis. Neurol Clin. 1994;12:263-271. 
  2. Berlit S, Tuschy B, Spaich S, et al. Miastenia gravis in pregnancy: a case report. Case Rep Obstet Gynecol. 2012;2012:736024. 
  3. Maselli R. Pathophysiology of miastenia gravis and Lambert-Eaton syndrome. Neurol Clin. 1994;12:285-303. 
  4. Sanwal M, Baduni N, Jain A. Caesarean section in a patient with miastenia gravis: a bigger challenge for the anaesthesiologist than the obstetrician. J Obstet Anaesth Crit Care. 2012;2:34-37. 
  5. Nacu A, Andersen JB, Lisnic V, et al. Complicating autoimmune diseases in miastenia gravis: a review. Autoimmunity. 2015;48:362-368. 
  6. Wendell LC, Levine JM. Myasthenic crisis. Neurohospitalist. 2011;1:16-22. 
  7. Chaudhuri A, Behan PO. Miastenia crisis. QJM. 2009;102:97-107. 
  8. Wolfe G, Kaminski H, Aban I, et al. Randomized trial of thymectomy in miastenia gravis. N Engl J Med. 2016;375:511- 522. 
  9. Ahmed A, Simmons Z. Drugs which may exacerbate or induce miastenia gravis: a clinician’s guide. Internet J Neurol. 2008;10:1-8. 
  10. Batocchi A, Majolini L, Evoli A, et al. Course and treatment of miastenia gravis during pregnancy. Neurology. 1999;52:447-452. 
  11. Rolbin W, Levinson G, Schnider S, et al. Anesthetic considerations for miastenia gravis and pregnancy. Anesth Analg. 1978;57:441-447. 

 

 

    This work by WFSA is licensed under a Creative Commons Attribution-NonCommercial-NoDerivitives 4.0 International License. To view this                                                      license, visit https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/ 

 WFSA Disclaimer 

The material and content provided has been set out in good faith for information and educational purposes only and is not intended as a substitute for the active involvement and judgement of appropriate professional medical and technical personnel. Neither we, the authors, nor other parties involved in its production make any representations or give any warranties with respect to its accuracy, applicability, or com- pleteness nor is any responsibility accepted for any adverse effects arising as a result of your reading or viewing this material and content. Any and all liability directly or indirectly arising from the use of this material and content is disclaimed without reservation. 

Tutorial Outline