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Tutorial 7

Capnografia Tutorial De Anestesia Da Semana

Dra. Gabriela Nerone

Correspondência para sba@sba.com.br

 

2nd DECEMBER 2014

INTRODUÇAO

O dióxido de carbono (CO2) é um produto do metabolismo celular que se dissolve no sangue e é transportado pela corrente sanguínea até os capilares pulmonares, a partir de onde se difunde através da membrana alvéolo-capilar. Uma vez no alvéolo, o CO2 depende da adequação da ventilação e da perviedade das vias aéreas inferiores e superiores para ser exalado e eliminado do organismo. A ausência de CO2 no gás expirado significa alterações importantes em um ou mais desses processos.

Capnometria é a medida numérica do CO2 expirado. Quando essa informação é plotada em um gráfico em função do tempo ou volume expirado, recebe o nome de capnografia. O gás exalado passa por uma câmara que recebe radiação infravermelha. A luz é absorvida em diferentes intensidades de acordo com cada tipo de gás (CO2, N2O, anestésicos inalatórios) e, a partir dessa informação, deriva-se o valor da pressão parcial do gás desejado, no caso o CO21.

PaCO2 é a pressão parcial arterial de dióxido de carbono. PACO2 é a pressão parcial de CO2 no alvéolo e, devido à grande capacidade de difusão desse gás, pode-se presumir que PaCO2 = PACO22. PETCO2 é a pressão parcial de CO2 ao final da expiração, que em indivíduos normais em ventilação espontânea gira em torno dos 38mmHg. Denomina-se hipercapnia a PCO2 maior que o esperado e hipocapnia a PCO2 menor que o esperado 3.

TIPOS DE CAPNÓGRAFOS

Sidestream (fluxo lateral)

Nesse tipo de analisador, um volume fixo de gás é aspirado continuamente do circuito de ventilação, a taxas que variam de 50 a 500 mL/min, e transmitido através de um tubo de nylon ou teflon até a câmara analisadora. Após a análise, a amostra pode ser descartada para a atmosfera ou devolvida para o circuito de ventilação através de um tubo secundário.

O local de amostragem deve ser o mais próximo do paciente possível para evitar diminuição artifactual da PETCO2 devido ao espaço morto do circuito. Problemas relacionados a esse tipo de sistema incluem o tempo de resposta aumentado, devido ao tempo desde a expiração até a chegada do ar à câmara analisadora, e a suscetibilidade à condensação ou obstrução do circuito de amostragem. Devese ainda atentar para a taxa de amostragem, que não deve ser maior do que o fluxo de gás fresco nem que a frequência expiratória. Isso é particularmente importante em crianças, já que os volumes são menores e essa inadequação pode resultar em amostragem do ar inspirado, hipoventilação do paciente e medidas erroneamente baixas da PETCO2.

Mainstream (fluxo principal)

Esse tipo de capnógrafo incorpora o sensor infravermelho ao circuito, muito próximo ao tubo endotraqueal. Assim, elimina-se o problema da amostragem de ar expirado e do tempo de resposta prolongado, inerentes aos sistemas sidestream. Por isso, são geralmente utilizados na população pediátrica.

Desvantagens desse tipo de analisador incluem o peso da câmara analisadora, a necessidade de calibragem diária e o risco de queimadura ao contato com a pele do paciente, uma vez que a câmara deve ser aquecida a 40oC para prevenir a condensação do gás expirado no sensor.

CAPNOGRAFIA NORMAL

O conceito de espaço morto (EM)  é crucial para o entendimento da capnografia.

Espaço morto é a parte do volume corrente que não faz hematose. É dividido em:

  • Espaço morto anatômico: é o volume médio das vias aéreas condutivas, não recobertas por superfície de troca gasosa, em torno de 2,2ml/kg
  • Espaço morto alveolar: gás que chega até os alvéolos porém não faz hematose devido à ausência de perfusão (Zona 1 de West) ou heterogeneidade na relação ventilação/perfusão (V/Q), com perfusão mínima para alvéolos bem-ventilados (V/Q alta).

O gás alveolar (PACO2) é diluído por gás do espaço morto fisiológico, resultando em uma PETCO2 em média 3-5mmHg menor que a PACO2 e, portanto, que a PaCO2 em indivíduos normais. Essa diferença aumenta para 5-10mmHg durante a anestesia devido à vasodilatação provocada pelos anestésicos, que resulta em aumento da heterogeneidade V/Q.

A compreensão da equação para determinação da PACO2, derivada da equação de Fick, auxilia o raciocínio diagnóstico sobre possíveis alterações na capnografia:

PACO2 = PBs [(FiCO2 + VCO2)/VA]

em que PBs = pressão barométrica seca, FiCO2 = fração inspirada de CO2, VCO2 = vazão de CO2 para dentro do alvéolo e VA =   ventilação alveolar.

Sendo assim, aumento da PACO2 pode resultar de aumento da FiCO2 (absorvedor de CO2 esgotado, defeito nas válvulas unidirecionais do sistema de ventilação), aumento na vazão de CO2 para o alvéolo (hipertermia maligna, tireotoxicose, febre, liberação de torniquete, administração de bicarbonato), ou ainda de diminuição na ventilação alveolar.

A capnografia normal é dividida em 4 fases. A fase I (A-B na figura 1) é a linha de base, que representa a inspiração, em que normalmente não há CO2. A fase II (B-C) é a ascensão expiratória do CO2, que apresenta inclinação íngreme em indivíduos normais. O ar do início da expiração é o gás do espaço morto anatômico, das grandes vias aéreas, portanto não tem CO2. A medida que a expiração continua, esse ar é substituído pelo ar alveolar, repleto de CO2. Isso resulta na fase III (C-D), chamada de platô alveolar, que pode ter uma inclinação ascendente discreta em indivíduos normais devido à heterogeneidade da relação V/Q. Alvéolos com baixa relação V/Q e, portanto, pressões parciais maiores de CO2, tendem a esvaziar-se mais lentamente do que aqueles com V/Q normal. A fase IV (DE) é o descenso inspiratório e representa a substituição do gás alveolar por gás fresco na câmara de amostragem.

Figura 1

Figura 1. Capnografia normal4

APLICAÇÕES

Confirmação da Intubação Traqueal

A presença de CO2 no gás expirado é o método padrão-ouro para a confirmação do correto posicionamento de um tubo traqueal. Em indivíduos ventilados sob máscara facial ou laríngea antes da intubação, pode haver CO2 no estômago, portanto para que se constate intubação traqueal, deve haver consistência e recorrência do CO2 no gás expirado.

Anestesia Geral

O uso da capnografia durante anestesia geral é mandatório conforme a Sociedade Americana de Anestesiologia e a Resolução 1802/2006 do CFM, que regulamenta o ato anestésico no Brasil.

Além da já mencionada confirmação da intubação traqueal, a análise do CO2 expirado permite o diagnóstico de uma variedade de situações potencialmente catastróficas. Aumento da PETCO2 pode alertar para hipoventilação alveolar, hipertermia maligna e tireotoxicose, ao passo que diminuições abruptas podem chamar a atenção para causas de redução marcada ou ausência de perfusão pulmonar, por exemplo parada cardiorrespiratória (figura 2) e embolia pulmonar maciça. O gráfico de tendências pode mostrar diminuições mais discretas em casos de “chuva de êmbolos” (figura 3) causando aumento do espaço morto alveolar, como em neurocirurgias de fossa posterior e durante a cimentação de próteses, principalmente de quadril.

Figura 2

Figura 2. Indução de fibrilação ventricular durante implantação de cardioversor – diminuição súbita da PETCO2 relacionada com ausência de débito cardíaco.

Figura 3

Figura 3. Diminuição gradual da PETCO2 compatível com breve “chuva de êmbolos” em cirurgia de fossa posterior do crânio.

A análise da curva da capnografia pode indicar a presença de reinalação (figura 4), defeitos em válvulas unidirecionais do sistema de ventilação (figura 5), esforços inspiratórios por parte do paciente (figura 6), oscilações cardiogênicas (figura 7) e, principalmente, doença pulmonar obstrutiva.

Doenças pulmonares obstrutivas reduzem mais a ventilação em alguns alvéolos do que em outros, resultando em aumento da heterogeneidade V/Q. Alvéolos bem-ventilados (baixa PACO2) tendem a esvaziar-se antes do que aqueles mal-ventilados (alta PACO2). Devido ao esvaziamento alveolar lento e sequencial (ao invés de relativamente sincrônico, como em pacientes saudáveis), observa-se uma linha ascendente quase contínua, com aumento marcado do ângulo alfa entre as fases II e III e ausência ou encurtamento do platô alveolar 5.

Figura 4

Figura 4. Reinalação de CO2.

Figura 5

Figura 5. Incompetência da válvula inspiratória (A) e expiratória (B).

Figura 6

Figura 6. Esforços inspiratórios por parte do paciente (“fenda do curare”)

Figura 7

Figura 7. Oscilações cardiogênicas: chegada de CO2 novo ao sítio de amostragem por convecção a partir dos batimentos cardíacos e sua tração sobre a arquitetura alveolar.

Doenças pulmonares obstrutivas reduzem mais a ventilação em alguns alvéolos do que em outros, resultando em aumento da heterogeneidade V/Q. Alvéolos bem-ventilados (baixa PACO2) tendem a esvaziar-se antes do que aqueles mal-ventilados (alta PACO2). Devido ao esvaziamento alveolar lento e sequencial (ao invés de relativamente sincrônico, como em pacientes saudáveis), observa-se uma linha ascendente quase contínua, com aumento marcado do ângulo alfa entre as fases II e III e ausência ou encurtamento do platô alveolar 5 (figura 8).

Figura 8

Figura 8. Ângulo alfa entre as fases II e III da capnografia em paciente normal (E) e com broncoespasmo (D)

Sedação moderada ou profunda

A oximetria de pulso não é eficaz em detectar hipoventilação alveolar e apnéia – pode-se ver na figura 9 que a administração de oxigênio suplementar mesmo em fluxos relativamente baixos pode mascarar substancialmente a hipoventilação alveolar. Até que um episódio de apnéia seja detectado através da oximetria, o paciente pode estar significativamente hipercápnico e acidótico. Tendo em vista que a incidência de apnéia durante sedação venosa pode ser de até 25%6 e que a sedação venosa vem sendo amplamente utilizada para uma série de procedimentos sob o cuidado de anestesiologistas ou não, em 2010 a ASA incluiu a capnografia no rol da monitorização mínima obrigatória durante sedação moderada ou profunda.

Figura 9

Figura 9. Efeito da administração de O2 a 30% sobre a saturação da oxihemoglobina em comparação com a saturação esperada em ar ambiente.

Reanimação Cardiopulmonar

Durante uma parada cardiorrespiratória, o metabolismo celular continua gerando CO2 e, mantida ventilação constante, o maior determinante da sua eliminação do organismo é a taxa de entrega da periferia aos capilares pulmonares (circulação). Devido à sua correlação com o débito cardíaco, o CO2 expirado é atualmente o melhor parâmetro para avaliar a adequação das compressões torácicas e também permite o diagnóstico precoce do retorno à circulação espontânea.

MAPA MENTAL – INTERPRETAÇÃO RÁPIDA DA CAPNOGRAFIA

Figura

Figura . Mapa mental para a interpretação rápida da capnografia5

  1. Platô (início): existe um padrão sugerindo que o paciente esteja sendo ventilado?
  2. Platô (final): os valores de pico são apropriados? Os parâmetros do ventilador e o padrão ventilatório do paciente são consistentes com os achados capnométricos e capnográficos?
  3. Linha de base: a pressão parcial inspirada de CO2 é zero ou existe evidência de reinalação (linha de base elevada)?
  4. Ângulo de ascendência (upstroke): existe evidência de expiração lentificada (upstroke inclinado)?
  5. Platô (horizontalidade): existe evidência de esvaziamento desigual das unidades funcionais dos pulmões?
  6. Platô (continuidade): a expiração é interrompida por esforços inspiratórios (“fenda do curare”)?
  7. Ângulo de descendência (downstroke): o descenso é íngreme ou existe evidência de inspiração lentificada ou reinalação parcial?

REFERENCIAS

  1. Miller RD. Miller’s Anesthesia 7th Ed. Churchill Livingstone.
  2. West JB. The Essentials of Respiratory Physiology 9th Ed. Lippincott Williams & Wilkins.
  3. N Engl J Med. 2012 Nov 8;367(19):e27. doi: 10.1056/NEJMvcm1105237.
  4. Reich DL. Monitoring in Anesthesia and Perioperative Care 1st Ed. Cambridge University Press.
  5. Gravenstein JS, Jaffe MB, Gravenstein N, Paulus DA. Capnography 2nd Ed. Cambridge University Press.
  6. Soto RG, Fu ES, Vila H Jr, Miguel RV. Capnography accurately detects apnea during monitored anesthesia care. Anesth Analg. 2004. Aug;99(2):379-82.
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