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Paediatric Anaesthesia

Tutorial 246

Tutorial De Anestesia Da Semana Anestesia E Infecções De Vias Aéreas Superiores Em Crianças

Ma Carmen Bernardo-Ocampo
Professora e anestesiologista da Universidade de Washington SOM/Hospital Pediátrico de Seattle

Tradução: Dra. Gabriela nerone e Dra. Maria Eduarda Dias Brinhosa Hospital Governador Celso Ramos, Florianópolis, Brasil

Email: dudabrinhosa@hotmail.com

2 DE DEZEMBRO DE 2012


PERGUNTAS

Antes de ler o tutorial, tente responder às questões abaixo com verdadeiro ou falso. Mais de uma afirmativa pode estar correta para cada questão. As respostas podem ser encontradas ao fim do tutorial.

  1. Os mecanismos de hiperrreatividade da via aérea induzidos por vírus incluem:
    a. Liberação de mediadores químicos.
    b. Ativação de receptores M2 resultando no aumento da liberação de acetilcolina.
    c. Aumento da resposta constritora da musculatura lisa a taquicininas.
    d. Resposta vagal.
  2. Fatores de risco para complicações respiratórias perioperatórias são:
    a. Congestão nasal.
    b. Secreção copiosa.
    c. Tabagista passivo.
    d. Cirurgia de via aérea.
    e. Confirmação de IVAS pelos pais da criança.
    f. Doenças com reatividade de vias aéreas.
    g. História de ronco.
  3. Quais dos itens seguintes devem ser considerados ao optar-se pelo cancelamento ou prosseguimento de uma cirurgia eletiva na criança com IVAS?
    a. Idade da criança e sintomas presentes.
    b. Tipo de cirurgia a ser realizada.
    c. Necessidade de intubação traqueal.
    d. Freqüência com que a criança apresenta IVAS.
    e. O conforto do anestesiologista e sua experiência profissional.
  4. Quais das seguintes afirmativas se aplicam ao manejo anestésico da criança com IVAS:
    a. Os objetivos são minimizar a secreção e limitar a estimulação da via aérea.
    b. A via aérea deve ser aspirada após a criança perder o reflexo ciliar.
    c. Os broncodilatadores com ou sem esteróides no pré-operatório não atenuam a resposta broncoconstritora desencadeada pela manipulação da via aérea.
    d. Como agente indutor, o sevoflurano é melhor que o propofol.
    e. É preferível utilizar um tubo endotraqueal a uma máscara laríngea ou máscara facial para assegurar a via aérea.
    f. Não há diferença nas complicações respiratórias se comparadas a técnica endovenosa e a inalatória de anestesia.
    g. Como consenso geral é preferível remover o TOT apenas após acordado do que em plano profundo.

INTRODUÇÃO

As infecções de vias aéreas superiores (IVAS) são a principal causa de consultas à emergência ou ambulatórios pediátricos nos Estados Unidos. A maioria dos adultos apresenta de 2 a 4 episódios de IVAS em um ano, enquanto a maioria das crianças apresenta de 6 a 8 quadros de IVAS por ano. Aproximadamente 200 tipos de vírus podem causar a infecção das vias aéreas, com sintomas clínicos de tosse, congestão nasal, dor de garganta e espirros. A hiperreatividade das vias aérea é comum após um quadro de IVAS, e gera implicações importantes na anestesia. Noventa e cinco por cento das IVAS apresenta etiologia viral, e o rinovírus é responsável por 30 a 40% dos casos.

FISIOPATOLOGIA DA HIPERREATIVIDADE BRÔNQUICA

Foram descobertos diversos mecanismos determinantes da hiperreatividade de vias aéreas após uma IVAS de etiologia viral, incluindo mediadores químicos e reflexos neurológicos. A broncoconstrição pode estar relacionada a mediadores inflamatórios no local danificado pelos vírus, como a bradicinina, prostaglandinas, histamina e interleucinas. A estimulação de receptores M2 presentes nas terminações vagais geralmente resulta em inibição da liberação de acetilcolina. Acredita-se que as neuroaminidases virais são capazes de inibir esses receptores e aumentar a liberação de acetilcolina, causando broncoconstrição. A atropina é capaz de bloquear a hiperreatividade brônquica, o que sustenta a teoria da importância do componente da resposta vagal. Taquicininas atuam na contração da musculatura lisa e são normalmente inativadas pelas endopeptidases neutras, porém a infecção viral pode inibir a atividade dessas endopeptidases resultando em aumento da resposta constritora da musculatura lisa às taquicininas.

DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS DE IVAS

Diversas infecções podem se manifestar na forma de tosse, congestão nasal e dor de garganta, mimetizando os sinais e sintomas de uma IVAS viral. Diagnósticos diferenciais importantes incluem:

Causas Infecciosas

  • Crupe
  • Influenza
  • Epiglotite
  • Faringite estreptocócica
  • Herpes simples
  • Bronquite
  • Pneumonia

Causas não-infecciosas

  • Rinite alérgica ou vasomotora
  • Asma
  • Aspiração de corpo estranho
  • Refluxo gastroesofágico

FATORES DE RISCO PERIOPERATÓRIOS PARA EVENTOS ADVERSOS RESPIRATÓRIOS

A história de IVAS ou outras doenças respiratórias aumentam o risco dos seguintes eventos adversos respiratórios no perioperatório:

  • Tosse
  • Laringospasmo
  • Broncospasmo
  • Obstrução de via aérea
  • Dessaturação de oxigênio, menor que 90% por 10 segundos ou mais
  • Atelectasia
  • Estridor pós extubação
  • Pneumonia
  • Intubação ou reintubação imprevista

O risco de complicações perioperatórias é maior na presença de infecção aguda, mas permanece aumentado por 2 a 6 semana após a IVAS, com a reatividade das vias aéreas permanecendo aumentada por 6 a 8 semanas. Crianças submetidas a cirurgias de grande porte apresentam maior risco de complicações, principalmente as infecciosas. A maioria das intercorrências perioperatórias são facilmente manejadas e são efêmeras.

A incidência e fatores de risco para eventos respiratórios adversos foi investigada por grandes estudos de coorte (Tait et al, von Ungern Sternberg et al). Crianças com IVAS ativa ou recente (2 a 4 semanas) apresentam maior freqüência de apnéia, dessaturação de oxigênio e tosse grave quando comparadas a crianças sem história de IVAS.

Fatores de risco independentes para eventos respiratórios adversos em crianças com IVAS aguda incluem:

  • Intubação
  • Prematuridade (<37 semanas)
  • História de asma ou atopia
  • Familiares tabagistas
  • Cirurgia de via aérea
  • Presença de secreção abundante
  • Congestão nasal
  • Confirmação pelos pais de que a criança pode estar resfriada
  • Ronco

A indução inalatória (sevoflurano, halotano) está mais associada a eventos respiratórios adversos que a indução com propofol; e a indução com tiopental relaciona-se com os maiores riscos de complicações. Quanto maior a experiência do anestesiologista, menor a incidência de complicações. A não reversão do bloqueio neuromuscular aumenta a incidência de complicações.

ABORDAGEM PRÉ-OPERATÓRIA

Baseado na história clínica e exame físico, a IVAS da criança pode ser categorizada em leve e sem complicações a grave. Casos leves apresentam rinorréia, porém a criança permanece com aspecto saudável, afebril e com pulmões limpos à ausculta. Casos graves se apresentam com febre >38°C, secreção nasal purulenta, tosse produtiva, piora do estado geral e sinais de acometimento pulmonar. A maioria das crianças com IVAS leve pode ser anestesiada sem aumento da morbidade, enquanto as que apresentam IVAS grave devem ter cirurgias eletivas suspensas e adiadas por quatro semanas, pelo menos. Eventos adversos respiratórios podem ser previstos, precocemente reconhecidos e tratados.

Testes laboratoriais (radiografia de tórax, contagem leucocitária, swab ou aspirados nasofaríngeos) estão disponíveis para confirmar o diagnóstico de IVAS, porém eles raramente são necessários, aumentam os gastos em saúde e podem não ser práticos num cenário com grande número de pacientes. Radiografia de tórax deve ser considerada quando o exame físico sugere sinais de acometimento do trato respiratório inferior, momento em que a saturação de oxigênio também pode auxiliar no diagnóstico.

DEVE-SE ADIAR A CIRURGIA DE QUALQUER CRIANÇA QUE APRESENTE IVAS?

O cancelamento da cirurgia é uma conduta conservadora, porém de difícil prática em serviços lotados com aumento crescente do número de cirurgias e alta pressão para o andamento adequado das filas de espera de cirurgias. Ele evita complicações, mas aumenta o desgaste físico, psicológico e econômico dos familiares.

A avaliação da viabilidade da cirurgia para crianças com IVAS inclui múltiplos fatores, como a idade da criança, sintomatologia, urgência e tipo de procedimento, presença de comorbidades. Complicações respiratórias são mais freqüentes em crianças menores de um ano, por isso esse grupo exige maiores cuidados nos critérios para prosseguir com a cirurgia. A freqüência de IVAS vivenciada pela criança também deve ser considerada, uma vez que uma criança que apresenta 6 a 8 IVAS por ano dificilmente estará assintomática por período adequado para reagendamento da cirurgia eletiva.

A decisão para adiamento ou manutenção da data da cirurgia para uma criança com IVAS deve ser individualizada, considerando os fatores de risco, conforto e experiência do anestesiologista com anestesias em crianças com IVAS. Minha prática individual é de dar seguimento ao procedimento se a criança apresentar bom estado geral e apenas rinorréia clara, se não houver necessidade de IOT e a cirurgia não for de via aérea. Eu adio cirurgias eletivas se a criança apresentar secreção nasal purulenta, tosse produtiva, febre, sinais clínicos sugestivos de acometimento pulmonar (dessaturação ou sibilos). Em casos de cirurgias de grande porte, minhas restrições são ainda mais rígidas. Atualmente, a decisão sobre o cancelamento da cirurgia cabe ao anestesiologista após discussão com o cirurgião, que deve estar ciente de todos os riscos.

MANUSEIO ANESTÉSICO

Os objetivos do manuseio anestésico na criança com IVAS são minimizar as secreções e evitar ou limitar a estimulação de uma via aérea possivelmente reativa.

A via aérea deve ser aspirada somente em planos profundos de anestesia. A criança deve ser hidratada adequadamente e um umidificador pode auxiliar a limpar a via aérea e evitar acúmulo de muco/secreção.

Defende-se o uso de anticolinérgicos (atropina, glicopirrolato), embora estudos recentes tenham evidenciado ausência de benefício do glicopirrolato em relação ao placebo na redução da incidência de eventos respiratórios adversos nas crianças com IVAS submetidas a diversos tipos de cirurgias (otorrinolaringológicas, urológicas, ortopédicas e cirurgia geral).

Há evidências de que o uso de broncodilatadores de 10 a 30 minutos antes da cirurgia reduz a incidência de broncoconstrição e eventos respiratórios adversos. A combinação de B2 agonista, como o salbutamol, a um corticoesteróide inalatório é mais eficaz que o B2 agonista isolado na redução do risco de broncoconstrição desencadeado pela intubação.

Se possível, a intubação traqueal deve ser evitada, principalmente em crianças menores de 5 anos. Quando apropriadas, a máscara facial ou laríngea (ML) são preferíveis. A lubrificação da ML com lidocaína gel reduz a incidência de complicações de via aérea em crianças com IVAS.

Há menor incidência de eventos respiratórios adversos quando utilizado propofol como agente indutor ao invés de sevoflurano. Na manutenção da anestesia, pode-se utilizar agentes inalatórios ou endovenosos, desde que seja mantido um plano profundo de anestesia. O uso de sevoflurano na indução e manutenção está relacionado a menor incidência de complicações, se comparado ao uso de sevoflurano para indução e isoflurano na manutenção anestésica. Não há consenso sobre a profundidade anestésica adequada para a extubação ou remoção da ML. Muitos anestesiologistas preferem remover os dispositivos quando o paciente já está acordado pela recuperação dos reflexos protetores da via aérea e possibilidade de expelir secreções quando acordado. Outros advogam que a remoção dos dispositivos em plano profundo evita reflexos constritores da via aérea. Estudos não evidenciaram diferença na incidência de complicações em crianças com IVAS quando o TOT foi removido no paciente acordado ou em plano profundo.

CONCLUSÕES

Crianças com IVAS aguda ou recente (até 4 semanas) apresentam risco aumentado de complicações respiratórias perioperatórias. O conhecimento a respeito dos fatores de risco deve auxiliar nas medidas para melhora das condições do paciente e deve guiar a decisão a respeito do adiamento ou não da cirurgia. O consentimento informado, julgamento clínico adequado e experiência são fatores essenciais no processo de tomada de decisão.

RESPOSTAS

  1. a.V
    b. F, a inibição dos receptores M2 da via aérea pelas neuroaminidases virais resulta em um aumento da liberação de acetilcolina e broncoconstrição.
    c. V
    d. V
  2. VVVVVVV
  3. VVVVV
  4. a.V
    b. F, é importante aspirar a via aérea apenas quando a criança encontra-se em um plano anestésico profundo.
    c. F, administração de broncodilatadores isoladamente ou em combinação com corticoesteróides no pré-operatório minimiza a broncoconstrição desencadeada pela manipulação da via aérea.
    d. F, há menor incidência de eventos respiratórios adversos quando a indução é realizada com propofol ao invés de sevoflurano.
    e. F, o risco de complicações de via aérea em crianças com IVAS, em ordem decrescente: TOT> ML > máscara facial.
    f. V
    g. F, não há consenso sobre o plano anestésico adequado para extubação ou remoção da ML.
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